A verdade é que

BORBOREMA
2 min readJan 24, 2022

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É verdade que eu quero você?

Isso eu não posso dizer. Não consigo, nem se dissimulasse e encarasse um personagem. Às vezes sinto que me falta a ilusão dos românticos. Às vezes desejo ser daqueles que vivem a vivem sabendo que ela é passageira. Nos meus anos de vida, ¾ deles eu passei dentro de minha própria cabeça. Neste altura é o único lugar onde sei que sempre estarei — quase sempre — dolorosamente confortável.

Então penso que a verdade é que eu não quero você. Você não se encaixa na equação do EU. Mas deste eu me canso e cada vez mais frequentemente. Como sair de você? Ai, juro que vivo por momento de gozo anuviantes, mas duram frações, logo depois que saem de mim eu já estou de novo dentro de mim. Anti-gozo. A associação é lógica. O gozo está no outro. O gozo verdadeiro. É quando me torno animal, coisa, ser, vibração, gemido, anti-EU. A negação de tudo é mais fácil do que a síntese. De alguma forma tendemos para os extremos, os planos cinzentos são angustiantes. Mas, de novo, são frações minúsculas de tempo. Um relacionamento pode trazer isso? As minhas experiências dizem que sim, mas tudo envolve tanto trabalho. Eu me sentia preso entre luzes de Natal que ficaram guardadas no armário e de repente criaram nós impossíveis de serem desatados. Num relacionamento em me sinto sem ar e ao mesmo tempo me prendo por medo da solidão ser pior do que aquilo.

Às vezes eu realmente entro em termos com a minha solidão, no entanto é um contrato tão frágil que as traças de alguns poucos dias já conseguem roer. Às vezes vejo uma beleza na solidão, noutros momentos é uma dor difícil demais para suportar que nem o sono ou o álcool me faz superá-la. Procuro Deus no fundo do meu cinismo. Um relacionamento tudo resolveria, e com isso já entrego em uma única sentença o início e o fim de algo que sequer existe. Fantasio-me envolvo nos carinhos em uma pessoa sem rosto nem caráter nem corpo, uma pessoa que é só amor incondicional, uma pessoa abraço, uma pessoa transa. Fantasio-me a mim mesmo em formas mais primitivas, pessoa-necessidade.

Às vezes gosto da fantasia de que as coisas podem ter soluções fáceis, gosto da ideia de uma fórmula pronta, 3 passos para a felicidade, uma pessoa para me tirar de mim mesmo. Felicidade cínica que no fundo vem de uma suposição de superioridade.

Não é verdade que eu preciso de você.

A verdade é que quero ser feliz.

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